Diante da complexidade do fenômeno Vaticano II e da crise que se seguiu ao Concílio, adotam alguns católicos geralmente uma das linhas abaixo, com maior ou menos nuance:
- ou consideram-no liberal, e, por isso, o criticam acidamente e ao Magistério a ele posterior (os tradicionalistras, afinados com Marcel Lefébvre);
- ou, ainda considerando-o liberal, louvam-no justamente por isso, rechaçando dois mil anos de Magistério, como se a Igreja houvesse sido refundada no período conciliar, sem dar maior importância à Tradição (os liberais, progressistas, modernistas, teólogos da libertação);
- ou, enfim, consideram o Concílio tímido face às mudanças que gostariam fossem operadas, como se devesse “avançar” nas modas teológicas, alinhando a Igreja ao mundo (os ultraliberais, modernistas e progressistas radicais, teólogos da libertação ainda mais raivosos).
Não compactuo com nenhuma dessas correntes. Aliás, os católicos de verdade não podem filiar-se a elas. A Igreja não tem facções. É católica, universal. É una: una na doutrina, e una no governo. O Vaticano II não foi liberal, e tampouco o vejo como isento de termos dúbios. Foi importante, mas a Igreja e sua doutrina são a ele anterior.
Ainda que, em si, o Concílio não seja progressista (pois a Igreja é infalível, e o progressismo um erro), seus textos podem ser distorcidos (e de fato o foram!): para atacar a Igreja “de antes” (liberais) ou “de agora” (tradicionalistas). “Estou convencido”, diz o Papa Bento XVI, “de que os danos não são atribuíveis ao Concílio ‘verdadeiro’, mas ao desencadear-se, no interior da Igreja, de forças latentes agressivas (...), [e] no exterior, ao impacto de uma revolução cultural (...).” (A fé em crise?, p. 17)
Quanto às suas passagens de difícil interpretação, e aparentemente contraditórias com pronunciamentos eclesiásticos anteriores, só ao Magistério cabe a palavra final. No que tem o Vaticano II de clareza, resta-nos o assentimento da fé (devido à suprema autoridade de ensino da Igreja), e a obediência religiosa (devido à suprema autoridade de governo). No que tem de dubiedade, deixemos que a Igreja resolva, ilumine. Não é nossa função criticá-lo, nem interpretá-lo fora da Tradição ou do Magistério (anterior ou posterior).
“(...) defender hoje a Tradição verdadeira da Igreja significa defender o Concílio. (...) É ao hoje da Igreja que devemos permanecer fiéis, não ao ontem nem ao amanhã (...).” (op. cit., p. 18)
Andemos ao passo da Igreja, nem à frente nem atrás. Almejemos estar ex corde Ecclesiae, no coração da Igreja, certos de que agradaremos a Cristo pela doce sujeição ao Seu Vigário, o Papa. Esta a militância genuína que se nos é pedida: a fidelidade e a adesão ao Romano Pontífice e à doutrina de sempre da Igreja, reafirmada (e não negada) pelo Concílio, entendido este, porém, nos seus devidos termos, “[s]em reservas que os amputem. E sem arbítrios que os desfigurem.” (op. cit., p. 18)
Um comentário:
Caro Rafael,
Concordo plenamente com o senhor quando afirma que o católico deve alinhar-se com a Igreja, seu Magistério, sua doutrina e não filiar-se a correntes. Mas é aí que se encontra todo o problema: uma "corrente" conhecida como modernista, condenada por S.Pio X, ocupou a Igreja durante o Concílio Vaticano II alterando sua liturgia, seu catecismo, seus dogmas, sua moral etc, tornando impossível a prática católica nesses meios onde essa corrente penetrou. Os frutos malignos do Concílio Vaticano II são inequívocos: ecumenismo e liberdade religiosa que levaram um arrefecimento da fé e da prática religiosa em proporções assustadoras e inegáveis.
O católico então precisa tomar uma decisão para salvar sua Fé: ou aceitar as novidades dessa corrente ou procurar quem guardou o Depósito Sagrado.
Só não pode ficar comodamente instalado achando que a causa do Bem se defende por si mesma.
Muito obrigado,
Haroldo
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