sexta-feira, maio 21, 2010

sábado, maio 08, 2010

A Realeza da Virgem Maria e o Reinado de Nosso Senhor Jesus Cristo


Por Rafael Vitola Brodbeck

“Gloriem-se, portanto, todos os féis cristãos de estar submetidos ao império da virgem Mãe de Deus, que tem poder régio e se abrasa de amor materno.” (Papa Pio XII, Encíclica Ad Caeli Reginam, 41)

O Reinado de Cristo – esferas pessoal, espiritual, temporal e cósmica

Cristo Senhor é, por sua natureza divina, Rei do universo. Por Ele tudo que foi feito e sem Ele nada do que foi feito se fez, como diz a Igreja. Sendo Deus, Criador, não lhe poderia escapar a soberania sobre as criaturas.

Ao se Encarnar, todavia, Cristo, assumindo nossa natureza humana em tudo, exceto no pecado, conquistou o direito de realeza também segundo a carne. Reina por sua Paixão no trono da Cruz, mediante a qual conquistou, ensina a Igreja, a graça santificante para a salvação dos homens. Ao ressuscitar no terceiro dia, segundo as Escrituras, como fala o Credo Niceno-constantinopolitano, Cristo consagrou sua condição de Rei, o que será manifestado de modo universal quando dos eventos do último dia. A realeza de Jesus Cristo enquanto Deus e enquanto homem é doutrina inconteste do catolicismo, proclamada pela Bíblia e pela Tradição Apostólica, confirmada também pelo Magistério.

Tal Reinado de Cristo se dá, segundo a Encíclica Quas Primas, de Pio XI, em 1925, e os comentadores eclesiásticos, sobre quatro fundamentais esferas.

Primeiro, Cristo reina nas almas: pela onipresença divina, nas de todos os homens e, mormente, pela inabitação da graça santificante, nas que lhe são fiéis. E, para que esse Reinado passe do direito ao fato, precisam os homens, segundo o mesmo Papa, conformar sua vida a Cristo, para que Ele reine nas suas inteligências, nas suas vontades, e nas suas emoções, assim como nos seus corpos, como decorrência do reinado nas almas. Assim, poderíamos resumir que a primeira esfera na qual Cristo deve reinar é a pessoal.

Depois, Jesus Cristo reina na esfera espiritual: se a Igreja é a sociedade religiosa fundada pelo Senhor para a salvação do mundo, destinada a ministrar seus sacramentos e a pregar e conservar sua Palavra e seus ensinamentos, é natural que, já que Ele reina nas pessoas que a compõem, como reina em toda a humanidade de pleno direito, exerça seu império também sobre a própria Igreja. Não é à toa que diversas passagens do Evangelho, ao se referirem à Igreja, dão a ela a denominação de Reino de Deus (cf. Mt 13, 31-32.47-48).

Por sua vez, como as almas e a Igreja estão no mundo, e os homens, além de fiéis da sociedade religiosa, são súditos de uma autoridade constituída sobre a sociedade civil, deve Jesus reinar igualmente sobre a esfera temporal, de modo que as leis seculares, se dadas em um contexto cristão, se coadunem com a fé. O Estado e Igreja devem manter sua soberania e sua independência um do outro, mas trabalhar em conjunto nos pontos comuns, unindo-se, sem se confundirem, é o que ensina a doutrina social católica, quando os súditos civis são os súditos religiosos, para que a lei estatal não fira a lei eclesiástica e a divina. E mesmo nos Estados soberanos sobre sociedades não católicas, um mínimo de respeito à moral, que é essencialmente natural e racional, deve ser observada pela autoridade.

O Reinado de Cristo, enfim, se estende por todo o mundo: as pessoas, a Igreja, a sociedade secular, os animais, os vegetais, os planetas, as estrelas, os anjos e também os demônios – ainda que estes não se submetam, devem dobrar seus joelhos conforme a Escritura: Fl 2,10. É o Reinado Universal de Jesus Cristo, ou cósmico, tão caro aos orientais, que representam o Senhor com o ícone do Pantokrator.

O dogma da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria e sua realeza

Da relação entre a dignidade régia de Maria Santíssima e o dogma de sua Assunção aos céus, nos fala o Concílio Ecumênico Vaticano II:

A Virgem Imaculada, preservada imune de toda a mancha da culpa original, terminado o curso da vida terrestre, foi elevada ao céu em corpo e alma e exaltada por Deus como Rainha do universo, para assim se conformar mais plenamente com seu Filho, Senhor dos senhores e vencedor do pecado e da morte.[1]

Em 1950, o Santo Padre Pio XII proclama, diante de uma multidão de sacerdotes, religiosos e fiéis do mundo todo, o dogma, tão aguardado, da Assunção da Virgem Maria aos céus, em corpo e alma.

Trata-se do reconhecimento oficial de um sentimento de fé que nos chega do início do cristianismo, já celebrado, em seus albores, com a festa da Dormição da Mãe de Deus.

Por outro lado, é uma consequência natural de outro dogma: o da Imaculada Conceição de Maria, pelo qual se afirma que, no instante de sua concepção no seio de Santana, sua mãe, a Virgem foi preservada por Deus da mancha do pecado original. De fato, Pio IX, em 1854, se expressa da seguinte maneira, em latim, por sua Bula Ineffabilis Deus:

(...) [D]eclaramos, pronunciamos e definimos que a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus, e por isto deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis. [2]

Se Maria é livre do pecado original, como não estaria já ressuscitada? A separação entre corpo e alma, entre a matéria e a forma, não é uma pena pelo pecado original, como nos ensinam os teólogos? Desse modo, do dogma da Imaculada Conceição, em profunda e delicada harmonia, surge o dogma da Assunção: reconhece a Igreja, pela suprema autoridade do Romano Pontífice, tendo consultado o orbe católico, que a mesma Mãe de Deus que foi preservada do pecado subiu aos céus não só em alma, mas em corpo.

A Constituição Munificentissimus Deus, de Pio XII, adota as seguintes e inequívocas palavras sobre o tema:

[P]ronunciamos, declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que: a imaculada Mãe de Deus, a sempre virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial.[3]

Ora, estando Maria nos céus desde o instante em que findou sua vida terrena, não pode estar lá sem a condição de reinar com Cristo, seu Filho. Todos os dogmas marianos apontam para a realeza da Virgem Maria.

Em primeiro lugar, é Mãe de Deus. Se Maria é Mãe de Cristo e Ele, em virtude da União Hipostática, é Deus e homem ao mesmo, a Virgem é Mãe de Deus, conforme definiu o Concílio Ecumênico de Éfeso, contra os nestorianos. Admitir que Maria não seja Mãe de Deus equivaleria a separar tão radicalmente as naturezas humana e divina de Cristo que restariam duas pessoas no mesmo Salvador, em uma espécie de “esquizofrenia cristológica”. Jesus Cristo, Deus e homem, é Rei de todo o universo, já o vimos. E Rei por sua natureza divina, dado que é Deus, desde todos os séculos, e por sua natureza humana, por ter conquistado no trono da Cruz sua realeza e sua chefia de toda a humanidade perante Deus, qual novo Adão. Do mesmo modo, Maria, Mãe do Senhor, Mãe do Rei Jesus Cristo, é Rainha. De modo muito admirável, Nossa Senhora participa da realeza de Cristo, como menciona São João Damasceno, em uma de suas homilias sobre a Dormição: “Aproxima-te, ó Mãe, de teu Filho, aproxima-te e participa do poder régio daquele que, nascido de ti, contigo viveu na pobreza!”

Por sua vez, é também o dogma da Virgindade Perpétua um indicativo da realeza mariana. Permanecendo íntegra para melhor atender seus anelos de consagração, Maria constitui-se em uma mística Esposa do Espírito Santo. Como a esposa de Deus, que é Rei pela própria natureza, não compartilharia o reino? É bem verdade que não pertence esse reino por direito a Maria, como também não pertencem de direito os reinos da terra às rainhas que assim se constituem pelo casamento com os monarcas hereditários. Sem embargo, são essas esposas de reis também rainhas, mesmo que não descendam da casa real governante. Do mesmo modo, Maria não é rainha pela natureza das coisas, e sim por divina disposição. A realeza de Maria, Virgem desposada pelo Espírito Santo, se dá na ordem da graça: por ela, a Mãe de Deus é coroada. “Maria é Rainha do céu e da terra por graça, como Jesus Cristo o é por direito natural e de conquista.”[4]

Como terceiro dogma mariano, temos o da já mencionada Imaculada Conceição, e este também se relaciona com a dignidade real da Virgem Maria. Não tendo pecado, nem o original, tampouco os pessoais, Maria é a nova Eva, como Cristo é o novo Adão. Como novo Adão, Cristo é o nosso chefe, e, mesmo em sua natureza humana isoladamente considerada, o Rei da humanidade. De igual sorte, Maria, nova Eva, também nos representa, não por seus méritos próprios apenas, mas pela salvação antecipada de Cristo na Cruz que lhe foi ofertada em previsão do sacrifício vicário, no instante de sua concepção. E, como nova Eva, é também nossa Rainha. Por conta de sua Imaculada Conceição, intercede eficazmente junto de Cristo, o Rei, e é chamada por isso Rainha, como prefigura o salmista: “À vossa direita se encontra a rainha, com veste esplendente de ouro de Ofir.” (Sl 45,10)

Enfim, por ter sido assunta aos céus, objeto da quarta definição dogmática relativa a Maria, a Virgem é coroada por sua elevação e acolhida no céu. Anjos, santos e o próprio Jesus a coroam, como refletimos na tradicional recitação do rosário, desde tempos imemoriais.

Não podemos deixar de notar, enfim, que, pelo Batismo, todos nos incorporamos a Cristo e à Igreja, seu Corpo Místico, recebendo dignidade sacerdotal, profética e régia. Todos, nesse âmbito da soteriologia, somos reis com Cristo, pois conquistados com sangue real – mística e de fato, pois Cristo é, pela carne, descendente da Casa de Davi, rei de Israel. Se todos os cristãos são, de certo modo, reis, em virtude da realeza de Jesus, como não seria rainha aquela que participa de uma maneira ainda mais excelsa da Pessoa de Cristo? Se nós somos pela graça o que o Verbo é pela natureza, Maria, cheia de graça, conforme o relato evangélico, é ainda mais íntima do Senhor. Nós, meros irmãos de Jesus pela graça somos reis. Mais direito à dignidade régia tem Maria, que de Jesus, o Rei, é Mãe. Sua íntima participação na Redenção de Cristo, inclusive com Ele sofrendo, ela que é Mãe das Dores, lhe confere esse título de Rainha.

Ademais, se todos os fiéis possuem dignidade real pela graça e sua incorporação a Cristo, Maria, sendo Mãe do Corpo Místico, é mãe de reis e, desse modo, igualmente rainha. A Virgem, concebendo a Cristo, concebeu seu Corpo Místico Total, i.e., a Cabeça, que é o próprio Cristo, e os membros, a Igreja. Nenhuma mãe concebe apenas a cabeça de seu filho. Nossa Senhora concebe, de modo místico, a toda a Igreja, e sendo os membros dessa Igreja constituídos em realeza pela graça, Maria, mãe de todos eles, Mãe da Igreja, também possui semelhante dignidade.

À objeção de que o culto a Maria Rainha se poderia desnaturar a ponto de nublar os atributos exclusivos de Cristo, pode-se responder com Santo Ildefonso: De tal sorte, transfere-se para o Rei aquela honra que, em humilde tributo, se presta à Rainha.”[5]

A devoção a Nossa Senhora como rainha na espiritualidade oriental

Muito cara aos cristãos orientais, católicos ou não, é a devoção à Mãe de Deus. Foi no contexto da Pars Orientalis do Império Romano que as grandes disputas teológicas foram travadas, de modo que a defesa dos privilégios cristológicos e mariológicos deixou profundas marcas nas almas daqueles fiéis. Separando-se da autoridade de Roma em 1054, os cismáticos bizantinos, contudo, mantiveram sua teologia e piedade marianas.

Aliás, essa teologia e piedade marianas dos que passaram a se chamar “ortodoxos” lhes foram legadas pelos Padres da Igreja do Oriente, na época em que estavam unidos a Roma e submissos ao Papado. É o que se verá com as citações abaixo, todas da época em que os orientais e os ocidentais estavam sob a mesma Igreja.

Santo André de Creta, por exemplo, chama Maria de “Rainha de todo o gênero humano, porque, fiel à significação do seu nome, se encontra acima de tudo quanto não é Deus.[6]

O Bispo São Germano, em oração a Nossa Senhora atribui-lhe o título de “Rainha e mais eminente que todos os reis”[7], enquanto o grande campeão da ortodoxia contra o iconoclasmo, o grande doutor de Damasco, São João, a venera como “rainha, protetora e senhora.”[8]. O mesmo São João Damasceno igualmente cognomina Maria “Rainha, Mãe do nosso bom Soberano.[9]

O próprio hino Akhatistos, da tradição bizantina, cantado até hoje por milhares de cristãos cismáticos autoproclamados “ortodoxos” e por católicos de rito grego, explicita: “Vou elevar um hino à rainha e Mãe de quem, ao celebrar, me aproximarei com alegria, para cantar com exultação alegremente as suas glórias (...). Salve, rainha do mundo, salve, ó Maria, senhora de todos nós.”

Também outro hino mariano bizantino, o Agni Parthene, proclama Maria “Virgem pura e Rainha” e “Esposa e Rainha”, “Santíssima Mãe e Rainha”, dirigindo-se a ela, depois, com as ternas palavras “Imploro-vos, ó Rainha, e vos suplico.”

A devoção popular, a liturgia romana e a realeza de Maria

A liturgia ocidental não cansa de chamar Nossa Senhora de Rainha. Assim as antífonas para depois das Completas, no Ofício Divino: Ave, Regina Coelorum, Salve Regina, Regina Coeli. Muitas antífonas ao Magnificat, igualmente no Ofício, dão conta da realeza de Maria. Sem contar a Ladainha de Nossa Senhora, inclusive no Ritual Romano e no breviário, em que constantes títulos de realeza mariana aparecem.

O próprio rosário, em seu quinto mistério glorioso, convida-nos a meditar a Coroação de Maria como Rainha do Céu e da Terra.

São Bernardo de Claraval, o grande reformador do monasticismo ocidental, revelou-se um apóstolo da Virgem, e podemos nos indagar se esse não era o segredo de sua fecundidade espiritual. Foi ele um piedoso propagador da oração da Salve Regina, reconhecendo, pois, a realeza de Maria. Aliás, a essa tradicional oração, o santo cisterciense incluiu o “O clemens, o pia, o dulcis Virgo Maria” de seu final. Tal é a herança bernardina que os cistercienses, em seu rito litúrgico próprio, só rezam, como antífona mariana após as Completas, a Salve, que lhe era tão cara. O mesmo São Bernardo comumente chamava Maria de sua “augusta Soberana”. Isso é um grande sinal da dignidade régia mariana como a criam os medievos.

O Reinado de Maria nas obras de São Luís Maria Grignion de Montfort e de São Maximiliano Maria Kolbe

Alguns santos profundamente devotos da Virgem se referiram a um Reino de Maria. Não faltaram confusões na conceituação do que viria a ser esse reino, e mesmo acusações de gnose e milenarismo foram lançadas contra pensadores, como o Dr. Plínio Corrêa de Oliveira e o Mons. João Clá Scognamiglio Dias, EP, que se debruçaram sobre esse importante capítulo da mariologia.

Como veremos, de gnose e milenarismo esse ensino não tem nada. Acusar os defensores do Reino de Maria de tais heresias seria o mesmo que negar ortodoxia a São Luís de Montfort e a São Maximiliano Kolbe, que tanto falaram nesse Reino.

Convém deixar claro, nessa altura, que o Reino de Maria, embora se refira, em boa dose, a terreno da escatologia, i.e., ao tratado das últimas coisas, ele não é uma época de ouro e sem pecados, como que antecipando a Parusia. Tampouco é reinado carnal de Jesus Cristo por Maria.

O Reino de Maria é, antes de tudo, o que se inicia nas almas. É, em uma palavra, a própria vida da graça na alma. Quem é filho de Deus Pai e irmão de Jesus Cristo, é filho de Maria. Quem serve a Cristo como Rei, venera a Maria como Rainha. Impossível ser de outro modo!

Assim se expressa o santo de Montfort:

Ora, assim como o reino de Jesus Cristo consiste principalmente no coração ou interior da pessoa humana, segundo as palavras: ‘O reino de Deus está dentro de vós’, assim também o reino da Santíssima Virgem está principalmente no interior da pessoa, isto é, na sua alma. É sobretudo nas almas que ela é glorificada com seu Filho mais do que em todas as criaturas visíveis, de tal forma que podemos chamá-la com os Santos: Rainha dos corações.[10]

Mas, assim como as almas não estão fora dos corpos exceto na morte, e os homens, compostos de alma e corpo, vivem em sociedade religiosa e civil, também esse Reino de Maria, reflexo e, em certa medida igual, ao Reino de Cristo, deve se estender para estruturas externas. Maria, partilhando da dignidade de Cristo, deve reinar nas almas, mas também na Igreja e na sociedade.

Para melhor sublinhar essa realidade, a expressão “Reino de Maria” está, de modo especial, relacionado com uma idéia de uma era de triunfo da Igreja. Não é por outro motivo, que a visão de Fátima se interpenetra com a espiritualidade montfortina. A Virgem, nas aparições de 1917 aos pastorinhos de Fátima, anunciou que, depois da crise de fé, por fim, seu Imaculado Coração triunfaria.

O triunfo do Imaculado Coração da Virgem e o Reino de Maria não constituem, pois, eventos distintos!

Não se confunda esse triunfo de Maria, que não é outra coisa que o triunfo da Igreja e da Civilização Cristã, com o milenarismo, como falamos. O milenarismo é a doutrina errônea segundo a qual haverá um reino visível e carnal de Cristo na terra por um período de mil anos (literais ou metafóricos), entre a primeira ressurreição dos corpos dos justos e a segunda no Juízo Final. Há uma sua versão mitigada, que não afirma a separação de ressurreições nem o reinado carnal e visível de Cristo, mas apenas de modo espiritual, o qual, por sua vez, segundo o Santo Ofício, “não pode ser ensinado sem perigo.”[11]

O Reino de Maria, na linha de Montfort e de Fátima, não é esse reino milenar, mas apenas um período histórico, não sem ausência do pecado, em que se refletirá com maior grandeza o brilho da Igreja e dos valores cristãos. Não deixará de ser um símbolo daquele paraíso do qual Cristo abrirá as portas em sua Parusia e Juízo Final, e, por isso, há uma certa correlação entre as duas situações. O Reino de Maria, triunfo do Imaculado Coração, é a realização do lema de São Pio X: “instaurar tudo em Cristo.” Será a era em que a Igreja, Corpo Místico de Cristo gerado pela Virgem, influenciará de modo especialmente magnífico a sociedade, de modo a que os homens sejam verdadeiros súditos de Cristo Rei e de Maria Rainha. Uma época de esplendor, mas em que o pecado e o mal continuam a existir, distinta, portanto, de qualquer “reino visível e carnal” milenarista, e mesmo anterior à Parusia e até ao domínio do Anticristo (que, historicamente, virá antes da Parusia). Chegar ao Reino de Maria não importa em contar as horas para o Juízo Final...

Esse período predito por São Luís de Montfort já fora ensinado por São Boaventura, o grande Doutor da Ordem Franciscana, como uma vitória temporal da Igreja Católica no mundo e na história, uma paz que não é a eterna que virá no fim do mundo, mas que Deus instituirá na terra como descanso após tanta perseguição à Igreja, ao Papa e aos católicos. E não é isso que vemos hoje, quando contemplamos a verdadeira orquestração e estrondo publicitário contra o Sumo Pontífice? É dessas lágrimas que Deus procurará nos consolar com um temporário e humano Reino de Maria.

O Reino de Maria é a vitória, ainda que temporária e mero símbolo antecipatório da verdadeira e definitiva vitória final na Parusia, dos direitos de Deus e da Igreja. É o que rezamos, como católicos e apóstolos, na Oração a Cristo Rei, rezada tradicionalmente em ação de graças após a Comunhão, e que vem em anexo de muitos breviários: nos comprometemos, em virtude de nosso Batismo, a lutar para que triunfem, por todos os meios possíveis e lícitos ao nosso alcance, os direitos de Deus e da Igreja! Quando isso acontecer, será o triunfo do Imaculado Coração.

Desaparecerão então as lutas de classes e a humanidade aproximar-se-á, quanto é possível nesta terra, da felicidade, de uma antecipação daquela felicidade rumo à qual cada um de nós já tende naturalmente, vale dizer, à felicidade sem limites, em Deus, no paraiso.[12]

São Luís de Montfort, no Tratado já aludido, mostra bem que o Reino de Maria não será a vitória definitiva, porém uma era de luzes para a grande Civilização Católica fundada sob as bases da Igreja:

Sim, querido irmão, quando chegará esse tempo feliz, essa era de Maria, em que muitas eleitas que terá obtido do Altíssimo, mergulharão voluntariamente no abismo das suas próprias entranhas, tornando-se cópias vivas de Maria, para amar e glorificar Jesus Cristo?[13]

É esse Reino que São Maximiliano Kolbe, frade franciscano conventual que foi mártir sob o nazismo, chamava de “era da Imaculada”. E as ideologias pagãs, totalitárias, anticristãs do comunismo e do nazismo, enfrentadas pelo santo, eram uma mostra da perseguição à verdade e à religião divinamente instituída. Daí que fossem parte do sofrimento pelo qual viria o Reino de Maria.

O carisma de São Maximiliano Kolbe, frade franciscano conventual, ai fundar sua Milícia da Imaculada era claramente a a instauração do misericordiosíssimo Reino da Imaculada sobre a terra.” Igualmente, esse apóstolo do Reino de Maria nos deixa consignado, ele que viveu no século XX: “Vivemos numa época que poderia ser chamada o início da era da Imaculada. Sob o seu estandarte haverá de combater-se uma grande batalha e haveremos de hastear as suas bandeiras sobre as fortalezas do rei das trevas.”

Kolbe estava profundamente convencido de que estávamos já iniciando esse Reino de Maria, e conclamava os seus discípulos a combater uma grande batalha espiritual ao fim da qual hasteariam, com fé e vigor, as suas bandeiras sobre as fortalezas do rei das trevas. E a Imaculada tornar-se-á Rainha do mundo inteiro e de cada alma individual.”[14]

São Luís Orione fala também desse triunfo do Imaculado Coração, como um período em que o catolicismo,

cheio de divina verdade, de caridade, de juventude, de força sobrenatural, levantar-se-á no mundo, e colocar-se-á à frente do século renascente, para conduzi-lo à honestidade, à fé, à felicidade, à salvação.[15]

Não é essa tese heterodoxa, pois o Romano Pontífice mesmo a professou, quando instituiu a festa de Nossa Senhora Rainha, de que nos ocupamos no presente artigo. A consagração do gênero humano ao Coração Imaculado de Maria, como pedida em Fátima, nos mesmos sucessos em que aquele Coração era predito que triunfaria, seria, segundo Pio XII, a grande esperança de que possa surgir uma nova era, alegrada pela paz cristã e pelo triunfo da religião.”[16]

Se o Reino de Maria é um símbolo do futuro Reino de Deus após o Juízo Final, por sua vez, a coroação da Virgem quando de sua Assunção aos céus, tal qual meditada no santo rosário, é como que uma antecipação do Reino de Maria escatológico. Tal ensino é confirmado pelo Magistério, como neste ponto da Rosarium Virginis Mariae, de João Paulo II, aliás, um escravo de Nossa Senhora pelo método de São Luís de Montfort: Ela resplandece como Rainha dos Anjos e dos Santos, antecipação e ponto culminante da condição escatológica da Igreja.”[17]

A coroação de Maria no mês de maio e a festa de Nossa Senhora no calendário litúrgico

O mês de maio é tradicionalmente consagrado a Maria Santíssima pela piedade dos fiéis”[18], e, portanto, objeto de importantes devoções à Virgem. É nele que se intensificam os rosários públicos, que os mistérios marianos ocupam as meditações diárias, Missas votivas em honra de Nossa Senhora são celebradas nos dias liturgicamente livres, flores são colocadas nos retábulos e oratórios, visitas a santuários da Mãe de Deus são feitas, e crianças vestidas de anjos saem em procissão para coroar imagens de Maria.

No hemisfério norte, em que se situa a Europa da qual herdamos o cristianismo, maio é o mês primaveril por excelência. Alguns viram nisso uma explicação para a tradição dedicá-lo a Nossa Senhora: é ela a mais bela das flores de todo o jardim criado por Deus. E a primavera cristã que nos chega por Maria aparece depois do inverno do pecado.

Justamente pelo costume de coroar-se a imagem da Virgem no último dia do mês de maio, é que o Papa Pio XII, refletindo sobre a realeza de Maria em sua Carta Encíclica Ad Caeli Reginam, instituiu sua festa naquela data. O dia 31 de maio, portanto, foi escolhido pelo Pontífice para a Festa de Nossa Senhora Rainha, com Missa e Ofício próprio, além da recitação pública da Consagração do Gênero Humano ao Imaculado Coração de Maria – à semelhança da consagração do mesmo gênero humano ao Sagrado Coração de Jesus nos dias do próprio Sagrado Coração e de Cristo Rei. As palavras do Papa foram claras, após dar as diretivas do que se deveria fazer no dia 31 de maio e o sentido da festa: “Tudo isso nos incute grande esperança de que há de surgir nova era, iluminada pela paz cristã e pelo triunfo da religião.”[19]

Notemos como o Pontífice une a noção da realeza de Maria com a era do triunfo da Igreja. Essa época de paz cristã e de vitória da religião cristã – que não é ainda a vitória definitiva nem se confunde com um suposto milênio em que Cristo reine materialmente – só se dará porque nela Maria reinará. Falar em Nossa Senhora Rainha é pensar no triunfo temporal do catolicismo. É Pio XII mesmo quem diz isso, confirmando o ensino de São Luís de Montfort, de São Maximiliano Kolbe, e da própria Virgem de Fátima. Maria é Rainha e, honrada como tal, nos fará chegar o seu Reino, que se caracteriza, no dizer do Papa “pela paz cristã e pelo triunfo da religião”, triunfo esse que é tão próprio do caráter régio de Nossa Senhora que ela não hesitou em chamar de “triunfo de seu Imaculado Coração”.

Mais tarde, o Papa Paulo VI, ao fazer a reforma do rito romano, reordenará o calendário litúrgico, passando a festa de Nossa Senhora Rainha para o dia 22 de agosto. Isso porque antes da reforma litúrgica, o dia 22 de agosto era reservado à festa do Imaculado Coração de Maria, e agora esta última passaria para o sábado seguinte ao Sagrado Coração de Jesus. O Sagrado Coração e o Imaculado Coração estariam mais próximos também na comemoração. Entendeu bem o Papa que a vacância de 22 de agosto deveria ser preenchida com a festa da realeza de Maria, e vemos nisso um sinal de que Paulo VI também cria no ensino de Montfort, de Kolbe e de Fátima: para o Papa, a realeza de Nossa Senhora se manifestará mais propriamente pelo triunfo do Imaculado Coração, e por isso colocou a festa da Rainha no mesmo dia da antiga festa do Coração quando este mudou de data. A transferência da festa de Maria Rainha para 22 de agosto, outrossim, aproximou-a de uma solenidade mariana da máxima importância: 15 de agosto, Assunção, que, aliás, é o momento máximo do reconhecimento de sua condição régia, quando é coroada por Cristo, pelos anjos e pelos santos, com doze estrelas, e proclamada Rainha do céu e da terra!

É de se constatar também que o antigo 31 de maio não ficou vazio em seu conteúdo mariano. No lugar de Nossa Senhora Rainha, que passou, como vimos, para o 22 de agosto, que, por sua vez, era a antiga festa do Imaculado Coração – e que, enfim, foi deslocada para o sábado após o Sagrado Coração –, no lugar de Nossa Senhora Rainha, dizíamos, está hoje a memória da Visitação de Nossa Senhora, que comemora a solicitude de Maria à sua prima Santa Isabel.

Será isso um sinal da Igreja, em seu calendário litúrgico, unindo a Visitação da Virgem à antiga festa da realeza mariana, como que a dizer que a Rainha nos virá visitar em uma era de paz e de, nas palavras de Pio XII, “triunfo da religião”? Não sabemos, mas tudo parece se encaixar perfeitamente...

Cristo Rei e Maria Rainha

Os Papas não cansaram de louvar Maria como Rainha. Não olvidemos o grande Papa Sisto IV, em sua Bula Cum Praeexcelsa, de 28 de fevereiro de 1476, em que explica ser Maria uma “rainha sempre vigilante, a interceder junto ao Rei, que ela gerou.” Também Pio IX, Leão XIII e Pio XII a chamam rainha do mundo, rainha do universa, rainha do céu e da terra. Paulo VI, em sua Encíclica Christi Matri Rosarii, de 15 de setembro de 1966, chama-a “Rainha da paz”. O mesmo Pontífice chega a declarar que Maria é “aquela que, sentada ao lado do Rei dos Séculos, resplandece como Rainha e intercede como Mãe.”[20]

Dentre as novas espiritualidades surgidas na Igreja nos séculos XIX e XX, muitas delas destacam-se à promoção específica do Reinado do Sagrado Coração de Cristo Rei. Destacam-se os padres do Sagrado Coração (dehonianos), o Apostolado da Oração liderado pelos jesuítas (tão propagado no Brasil pelo incansável devoto do Sagrado Coração, Pe. Bartolomeu Taddei, SJ), o Regnum Christi, braço leigo dos Legionários de Cristo, entre outros. E algumas dessas espiritualidades, como os Arautos do Evangelho, a Arca de Maria, a Milícia da Imaculada etc, consagram-se ao estabelecimento do Reino de Cristo nas almas e na sociedade mediante a explícita referência ao Reino de Maria.

Cristalino é o carisma do Servo de Deus Pe. José Kentenich, palotino que fundou a família religiosa de Schoenstatt, dedicado à promoção da realeza de Maria Santíssima, venerada sob o inequívoco título de “Mãe e Rainha Três Vezes Admirável”.

A pregação do Reino de Cristo, que se consumará na Parusia, mas que começa nas almas desde o início do cristianismo, é indissociável da meditação no Reino de Maria. O triunfo do Imaculado Coração de Nossa Senhora, período de luzes para a expansão da Igreja e consolidação da fé, após um período tenebroso, é como que um refrigério a confirmar que, após toda a história do homem na terra, vindo o Anticristo, este perderá, junto com seu chefe, Satanás, e, então, vindo Jesus Rei em glória, iniciará, aí, sim, a consumação do seu Reino, do qual a era da Imaculada é um sinal.

Para que venha o Reino de Cristo, ensinava Montfort, ansiemos pelo Reino de Maria! E ansiaremos por esse Reino se praticarmos a legítima piedade mariana: honrando a Mãe de Deus, pedindo sua intercessão e imitando suas virtudes. Renovemos, enfim, a consagração da humanidade ao seu Coração Imaculado, como pedido por ela mesma em Fátima, para que ele triunfe!

Rafael Vitola Brodbeck, casado e pai de família, é Delegado de Polícia no Rio Grande do Sul, atua na direção do site Fortes in Fide, e coordena o Salvem a Liturgia, sendo responsável nesse site pelos textos sobre erros litúrgicos, incentivo ao latim, e comentários sobre rubricas e normas. É membro da Sociedade Internacional Santo Tomás de Aquino (SITA/Roma), e da Academia Marial de Aparecida. Desde 1998, é incorporado ao Regnum Christi. Ministra palestras sobre temas litúrgicos e doutrinários, bastando contatá-lo pelos e-mails: rafael@salvemaliturgia.com, vitola@fortesinfide.com.br e rafael.brodbeck@fortesinfide.com.br



[1] Concílio Ecumênico Vaticano II. Constituição Dogmática Lumen Gentium, de 21 de novembro de 1964, 59

[2] Pio XI. Bula Ineffabilis Deus, de 8 de dezembro de 1854, in Denzinger, 2803

[3] Pio XII. Constituição Apostólica Munificentissimus Deus, de 1º de novembro de 1950

[4] SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, 38

[5] De virginitate perpetua sanctae Mariae, cap. XII: PL 96, 108.

[6] Homilla III in Dormitionem Ss.mae Deiparae: I PG 98, 303A

[7] In Praesentationem Ss.mae Deiparae, II: PG 98, 315C

[8] De fide orthodoxa, I, IV, c.14: PG 44,1158B

[9] Homilla I in Dormitionem, 14

[10] SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Ibidem, 38

[11] Santo Ofício. Decreto de 19-21 de julho de 1944, in Denzinger, 3839

[12] SÃO MAXIMILIANO MARIA KOLBE. La Regina della Polonia, in Rycerz, Maio de 1925, atualmente in "Gli Scritti", cit., vol. III, p. 209

[13] SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Ibidem, 217

[14] Carta ao Padre Floriano Koziura de 30 de Maio de 1931

[15] Carta de 3 de Julho de 1936, in Lettere, III ed. ampliata, Postulazione, vol. II, Roma 1969, pp. 369-370

[16] Pio XII. Encíclica Ad Coeli Reginam, de 11 de outubro de 1954, 45

[17] João Paulo II. Carta Apostólica Rosarium Virginis Mariae, de 16 de outubro de 2002, 23

[18] Paulo VI. Encíclica Mense Maio, de 29 de abril de 1965

[19] Pio XII. Encíclica Ad Caeli Reginam, de 11 de outubro de 1954, 45

[20] Paulo VI. Exortação Apostólica Marialis Cultus, de 2 de fevereiro de 1974, 6

terça-feira, maio 04, 2010

Reflexões sobre o Comunicado da Santa Sé acerca dos Legionários de Cristo e do Regnum Christi

ART!

Caríssimos,

Refletindo sobre o Comunicado da Santa Sé, resolvi expor alguns pensamentos:

1) O Papa fala que existe um núcleo do carisma que precisa ser preservado e desenvolvido. Ao mesmo tempo, fala de desvios no carisma que precisam ser corrigidos.

Não é o carisma que precisa ser corrigido. Um carisma é um dom dado por Deus, e se foi confirmado INFALIVELMENTE pela Igreja (as aprovações definitivas de estatutos são "fatos dogmáticos", conforme Ott, Penido etc), vem de Deus sem sombra de dúvida. Não pode a Igreja se enganar nem nos enganar.

Todavia, a interpretação do carisma pode ter sido feita de modo incorreto.

O carisma foi dado por Deus ao Pe. Maciel e a todos os co-fundadores. Entretanto, não nos esqueçamos que, estando à frente da Legião, como o fundador principal, competia ao Pe. Maciel a interpretação do carisma. Ora, se o Pe. Maciel, em determinado momento, se corrompeu, é bem possível não que o carisma tenha se corrompido, mas que alguns aspectos de sua interpretação, sim.

É isso que a Santa Sé pretende: corrigir o carisma nunca; corrigir alguns desvios na interpretação do carisma sempre.

2) A quem compete essa correção? À Igreja, claro, mas, concretamente, à própria Legião, ao próprio Reino. A tarefa é nossa, com o apoio e a supervisão do Papa. Não podemos nos furtar à nossa responsabilidade. A nós Deus manifestou o carisma. Um de nós, o Pe. Maciel, falhou: recuperemos isso, então, para que nós não falhemos.

3) Além disso, se alguns aspectos do carisma se corromperam, o que devemos fazer? O que fizeram os reformadores. Santa Teresa, ao fundar o Carmelo Descalço, voltou ao "primeiro amor" do Carmelo da Antiga Observância. O mesmo os fundadores dos capuchinhos, retornando ao núcleo de São Francisco. Igualmente, os cistercienses em relação a São Bento, e os trapistas em relação aos primeiros cistercienses.

Voltemos à primeira inspiração do Pe. Maciel, antes de se corromper. Somos co-fundadores, e, por isso, a nós nos toca, a nós nos cabe proceder a isso.

Claro, não podemos "voltar a Maciel", como os capuchinhos voltaram a Francisco. Este é santo, nosso fundador não. Porém, voltemos à inspiração primeira.

4) Além disso, o Movimento sempre teve pela figura dos co-fundadores uma consideração especial. O próprio Pe. Maciel nos ensinava isso.

Falta, talvez, valorizar MAIS essa figura. Se somos co-fundadores, o carisma também está conosco. E "ouvir" os membros ajude a talvez separar o joio do trigo. O que na aplicação das Constituições e Estatutos é carisma e o que é desvio? As Constituições e os Estatutos são carisma, claro, são vontade de Deus, mas sua aplicação nem sempre...

5) Apesar de definitivamente aprovadas as Constituições, significando que não são heterodoxas, i.e., que não possuem erro (e isso é garantia infalível), não se impede a reforma das mesmas. Essa reforma não implica em erro nas Constituições, mas em um juízo de OPORTUNIDADE e CONVENIÊNCIA da manutenção de regras que, TALVEZ, tenham favorecido certas interpretações equivocadas.

A reforma das Constituições, então, longe de atacar o carisma, ajudará a que o vivamos melhor, livres de cargas surgidas de errôneas interpretações.

6) Como fazer isso, na prática? Conversando com os diretores espirituais, e mantendo essa maravilhosa comunicação epistolar que é tradição leginária.

7) O lugar dos escritos do Pe. Maciel ainda deverá ser redefinido.

Aliás, o Pe. Evaristo Sada já nos disse, ano passado, que a principal fonte da espiritualidade da Legião NÃO são os escritos do fundador, mas a Imitação de Cristo.

Acho que alguns escritos permanecem do fundador, mas sem levar seu nome, e em frases esparsas. Isso já começou a ser feito com o excelente "Cristo al centro": são frases e pensamentos "de la espiritualidad de la Legión de Cristo y del Regnum Christi", tiradas de cartas do Pe. Maciel, do Pe. Álvaro e de outros legionários, dos estatutos etc. Penso que é isso que se fará, sempre contando com o auxílio da Igreja.

O tema da Militia Christi, que está no núcleo do carisma, como diz o Papa, é muito claro no Magistério sobre o Sagrado Coração de Jesus e sobre o Reinado de Cristo. Inspirou a Cristiada, por exemplo. E sempre tive para mim que isso é parte integrante do carisma. Não por acaso, a Legião surgiu no México, e teve o apoio do tio do fundador, que é canonizado, São Rafael Guízar y Valencia.

São Bernardo de Claraval também era um pregador da Militia Christi, pois é dele a regra usada pelos templários.

Gostaria de ouvi-los a respeito desses pensamentos soltos, e sujeitos à revisão, mas que faço por amor a Cristo, à Igreja e ao Movimento, e à minha vocação ao Regnum Christi!

Em Cristo e no Movimento,

Cân. 750 – § 1. Deve-se crer com fé divina e católica em tudo o que se contém na palavra de Deus escrita ou transmitida por Tradição, ou seja, no único depósito da fé confiado à Igreja, quando ao mesmo tempo é proposto como divinamente revelado quer pelo magistério solene da Igreja, quer pelo seu magistério ordinário e universal; isto é, o que se manifesta na adesão comum dos fiéis sob a condução do sagrado magistério; por conseguinte, todos têm a obrigação de evitar quaisquer doutrinas contrárias.

§ 2. Deve-se ainda firmemente aceitar e acreditar também em tudo o que é proposto de maneira definitiva pelo magistério da Igreja em matéria de fé e costumes, isto é, tudo o que se requer para conservar santamente e expor fielmente o depósito da fé; opõe-se, portanto, à doutrina da Igreja Católica quem rejeitar tais proposições consideradas definitivas.

Cân. 752 Não assentimento de fé, mas religioso obséquio de inteligência e vontade deve ser prestado à doutrina que o Sumo Pontífice ou o Colégio dos Bispos, ao exercerem o magistério autêntico, enunciam sobre a fé e os costumes, mesmo quando não tenham a intenção de proclamá-la por ato definitivo; portanto os fiéis procurem evitar tudo o que não esteja de acordo com ela.